2 de Agosto: Trallery, Early Seasons, Sounds of Silence, Joey Cape, Rikers, Hamlet, Havok, The Real McKensies, Gallows, Aborted, Bury Tomorrow, Gojira, Caliban, Five Finger Death Punch, Obituary, Testament, Carcass, Turbonegro e Lagwagon
Ao abrir o fecho da tenda apercebemo-nos que S.Pedro não estaria de todo a nosso favor. As maratonas de Viveiro são perseguidas de paisagens sonoras do mais alto nível mas fisicamente desgastantes e um acordar tão cinzento parece atenuar ainda mais as poucas energias ainda restantes.
A dormência passa a coragem, que fora bem necessária, com o relembrar de momentos quer da noite anterior como da primeira. Verifica-se novamente o horário, compra-se o bilhete de autocarro (o campismo livre está a uma boa meia hora de distância a pé) e arrancamos para um dia que muitos de nós guardarão relatos para contar aos netos.
Chegando ao recinto facilmente percebemos que a noite de sexta (a anterior) fora a dos excessos e que sábado fora o dia de pagar a factura. Era visível que o número de pessoas, aquela hora (13h-14h), tinha diminuído em relação aos dias anteriores.
De Maiorca os Trallery deram as boas vindas com o seu Thrash descaradamente influenciado pelos Metallica. Convém dizer que esta banda nasce de um tributo aos ícones de São Francisco.
Com o cancelamento dos As They Burn os parisienses Early Seasons serviram de Wildcard. Não se pode dizer que o seu metalcore tenha acrescentado algo ao festival e a introdução do texto dá para dar uma ideia… O mesmo cenário verificou-se com os Sounds of Silence com um bem barulhento death metal melódico.
Saltitando entre o Rituals Stage e o Chaos, como fora a nossa sina todos os dias e que não deixam senão saudades, encontramos Joey Cape num registo acústico. O que poderia ser um momento especial não conseguiu cativar assim tanto… Nada como voltar umas 11(!!) horas depois para ver se a coisa correria melhor com os Lagwagon todos reunidos em palco.
Com o cancelamento de todas as datas europeias dos norte-americanos de Boston Ramallah as coisas não estavam de todo a correr da melhor forma neste fase inicial do derradeiro dia de festival.
Curto e grosso foi o show de hardcore sem espinhas que os Rykers proporcionaram sendo o primeiro momento a destacar deste ultimo dia de Resurrection Fest.
A abertura do palco principal ficou a cargo dos madrilenos Hamlet com o seu metal bem popular e orelhudo e sem necessidade de legendas, o que é sempre um ponto a favor no país aqui ao lado.
Na tenda Rituals os Havok reuniam uma bela multidão. O seu thrash tem muitas influências nos clássicos norte americanos, curiosamente uma tendência mais virada para uns Anthrax do que para outros exemplos. Não ficarão nada mal referenciados num contexto com Angelus Apátrida e Vita Imana ( entre outros ) quando um dia referirem o bom metal que se prática em Espanha nos dias que correm.
A simpatia dos elementos da banda ficou espelhada na sua interação constante, dentro e fora de palco, com seus fãs, não perdendo a oportunidade de assistirem a alguns concertos no meio da multidão.
Mas sem vergonhas apresentavam-se os The Real Mckenzies no Chaos Stage de kilt como manda a tradição brindando o público com um dos concertos mais divertidos de toda a edição. Há muitos traços que os ligam aos Dropkick Murphys, que são também festa garantida, com o som característico da Gaita de Foles e o feeling punk rock descomprometido. O concerto de brindes, saltos, mosh, e que com jeitinho até dava para fazer o comboio!
É justo afirmar que falar de hardcore britânico hoje em dia, sem referir
Gallows, é deixar parte da tela em branco. É certo que o género em si não tomou proporções, ou uma matriz cultural de tamanha dimensão, como a cena Nova-iorquina, mas esta banda em particular sempre chamou a atenção quer da crítica como do público o que terá muito haver com o feeling punk, muito british ( ou será anti?).
Wade MacNeil cumpriu a formalidade de entrar em palco mas antes mesmo de começar o certame surpreendeu tudo e todos ao dirigir-se imediatamente para junto do público, e engane-se quem pense que isso significa juntar-se às grades, foi bem no meio da “zona de guerra”. Da torre frente ao palco era possível assistir a uma paisagem fora do comum: uma banda sem vocalista, umas centenas que se dirigiam para a zona frente ao palco algo confusos procurando pelo mais recente elemento da banda e um pequeno caos à volta do mesmo. Isto é punk, isto é hardcore! Uma imagem para recordar mais tarde.
“Last June” e “Outsider Art” de Gallows (2012), abriram da melhor forma um concerto que cedo que quis algo mais do que marcar o ponto. Um ataque directo ao top dos melhores desta edição.
Seguiu-se ainda “Misery” do agrado do público que reflecte um certo culto pela banda, a par de outros exemplos que este festival nos proporcionou.
Sem surpresas “In a Belly of a Shark” continua a ser o momento mais esperado. Um tema que nos faz lembrar Frank Carter e questionar muita coisa em relação ao seu papel na história dos Gallows…
Na recta final “Cross of Lorraine” e “Orchestra of Wolves”.
Possivelmente o maior exemplo de Brutal Death Metal de todo o RF, os belgas Aborted que substituíram da melhor forma os Pyrexia, esmagaram o público com paredes de som de uma violência grotesca numa banda sonora equiparada ao de uma chacina de um filme de categoria B.
Não é um estilo propriamente popular por estas andanças, e o seu som é ainda mais extremo do que alguns dos exemplos do dia anterior…
Pode não ter alcançado o nível de sucesso que mais tarde os históricos Carcass e Obituary alcançaram, mas mais uma vez se fez sentir verdadeiramente peso. Aquele que quase nos esmaga o tórax como se de um camião TIR se tratasse.
Aos
Bury Tomorrow restou a ingrata sina, e
percebem-se as críticas do público mais dado aos ‘cores‘, de um festival que foi sendo invadido pela mancha negra e cada vez mais extrema, sufocando de certa forma actuações como deste género. Como é que se aplica uma fórmula vencedora no contexto que a banda se deparou? Não se aplica. Muito menos quando se contam os minutos para o que possivelmente seria o concerto mais esperado do ano.
Acaba por ser uma pena, sem qualquer tipo de julgamento face à qualidade da banda em si, testemunhar que na primeira passagem da banda pelo festival esta não tenha conseguido o feedback que talvez conseguisse noutros belos cartazes que este já teve com alvo claro as sonoridades provenientes da base hardcore.
Com a meteorologia cada vez menos de acordo com a ideia que temos de um Open Air de Verão, os prognósticos pessimistas começavam a se confirmar.
Gojira são neste momento um fenómeno dentro das sonoridades pesadas. O seu ultimo álbum reafirmou as apostas mais antigas e conseguiu aumentar, e bastante, o número de fãs e curiosos.
A expectativa era grande e cedo se fez sentir a procura pelos melhores locais para assistir de perto à chegada dos franceses ao Main Stage.
Em tempos foram apontados como uma espécie de Machine Head europeus, uma comparação algo descontextualizada com as suas musicas e de certa forma algo descabida. No entanto, o fenómeno de popularidade, e mesmo o saudável hype criado em seu redor, acaba por relembrar aquele excitamento que pairava no ar no concerto que os norte-americanos deram no rock in rio com The Blackening, e o resultado foi mais do que memorável. ‘L’Enfant Sauvage’, é como nesse caso, um álbum que quer o seu lugar na história e ataques destes, directos, são raros e o público não fica imune a tal situação.
“Explosia” abre com um peso algo industrial com o seu riff esquizofrénico. Ouve-se um “go” e com este público não se brinca… Nem mesmo nos breaks típicos da sua sonoridade, um trademark já registado pelos franceses. “The Axe” é mais uma bomba desse tão afamado álbum a ser lançada bem cedo. Não havia tempo a perder.
Antes que se legitime a crítica alheia, lançam 3 temas de grande nível de ‘From Mars to Sirius’, ” Backbone”, com uma bateria tão ou mais destrutiva que muito death metal, “The Heaviest Mattter of the Universe” um clássico servido mal passado (ou até mesmo cru) e “Flying Whales”, um capricho só para quem pode, e os Gojira podem e nós aplaudimos.
Sem surpresas o momento chave da sua actuação e que conquistou definitivamente tudo e todos- metaleiros, punks e malta do hardcore- “L’Enfant Sauvage” é um tema incrível. Uma conquista com mais de César do que de Bonaparte. Eles chegaram, viram e venceram. E sem grande dificuldade aparente.
Não se mostraram entusiasmos por aí em diante, tudo muito calmo diga-se de passagem, mas com um forte papel dominante de Joe Duplantier. É certo que não cortou na comunicação com o público mas o papel de personagem fria e distante acenta-lhe bem melhor.
Para acabar, uma sequência de ‘The Way of All the Flesh’ com “Toxic Garbage Island”, “Oroborus” e “Vacuity”.
Esta setlist faz crer que a banda pretende neste momento retirar os frutos do sucesso recente comprovando-o com as bases do passado que não se desprendem de todo do que fora feito e aplaudido. Mais uma prova que nem sempre é uma questão de qualidade mas sim de timing perfeito. Para o público o timing certo é agora. Um concerto que muitos crêem que fora o melhor do festival, o que dificilmente se contrapõe. Não há chuva que pare esta gente e a escala do Wall of Death em “Flying Whales” dá para tirar algumas conclusões…
Como se digere um concerto desta magnitude olhando para o relógio e ainda serem 20h?!
Ghost Empire ainda cheira a novo e os alemães Caliban ainda não perderam o entusiasmo de sair do estúdio e apresentar as músicas ao vivo.
Os seus concertos são famosos pela loucura que se verifica nas movimentações, não só frente ao
palco mas por todo o recinto por onde passam. É relativamente fácil cruzarmo-nos com vídeos dos seus circle pits e walls of death. Era algo do género o que se esperava desta nova passagem da banda pelo RF e a forma algo ambiciosa de bater records não fora assim tão imediata, talvez pelo desgaste físico do concerto anterior.
A tenda estava bem composta e a tal loucura era incontestável mas daí a bater records…
De resto um concerto demasiado focado num álbum que tem a mais de moderno e a menos de positivo.
No fim do concerto dos Caliban fica a ideia que o mais apelativo para a multidão era mesmo a tenda em si, cada vez mais um ex libris neste ultimo dia.
Prova disso está na fraca adesão do público ao concerto dos veteranos Discharge. Quem não quis perder uma das poucas sessões de punk velha guarda que o cartaz oferecia sofreu um dilúvio de proporções épicas e poucos serão os relatos que encontrarão sobre esse acontecimento por isso mesmo. Para os fotógrafos em particular a coisa ficou impossível face ao perigo de exposição das suas máquinas.
Todos estes pormenores tornaram este concerto épico! Uma realidade que daqui em diante virará lenda.
Com a terra feita em papa rapidamente a água começava a acumular-se pelo recinto num lamaçal inacreditável.
A população punk era pela primeira vez uma maioria frente ao Chaos Stage que fora baptizado de forma impecável. Encharcados dos pés à cabeça e já bem salpicados da lama que saltava com o mosh pit, o primeiro a cair fez “eureka” naquela multidão que se apercebeu que S.Pedro acabava de instalar uma Piscina ao som de “Realities of War” e “Decontrol” assim como ” War is Hell”.
Os mergulhos na lama foram um fenómeno paralelo ao pujante som dos ingleses e do seu D-Beat.
Nunca um concerto de Punk foi tão Punk.
O sem número de acontecimentos que se iam desenrolando tornaram cada concerto uma aventura, e fora neste espírito que a multidão não desanimava, ou pelo menos tentava.
Os Five Finger Death Punch comprovaram ser uma das bandas do momento num show bem interactivo onde os californianos puxaram sucessivamente pelo público que sempre respondeu de forma até mesmo surpreendente.
As suas musicas são muito mais acessíveis que a maioria das bandas que marcaram passagem do festival. Talvez pelas características mais groovescas, muito 2000’s, com som muito limpo ou simplesmente pela performance em palco de todos, mas com destaque para o vocalista Ivan L. Moody.
Muitos sabiam as letras e o concerto fora um sucesso indiscutível, mesmo para quem tenha duvidado deste headliner.
O fenómeno da tenda Rituals teve o seu auge com os ícones do Death Metal, os americanos
Obituary que dias antes passavam pelo nosso país de onde chegavam reacções bastante positivas.
A chuva intensa que se fazia sentir conseguiu juntar um aglomerado de pessoas tão grande dentro do espaço que não é exagero dizer que muitos só em bicos dos pés é que conseguiam caber. Nunca a banda esperava ter uma audiência tão grande na Galiza.
Estes pioneiros de Tampa partiram pescoços num dos concertos mais desconfortáveis da história e mesmo assim rebentaram com temas dos dois primeiros álbuns, “Slowly We Rote “Cause of Death”.
O caminho para o palco principal era cada vez mais uma aventura mas a chuva parecia acalmar. Repare-se que acalmar significa chuva de verão…
No ano anterior passaram por Vagos e foram eles mais um pedaço de história a passar pelo RF 2014: Testament são ícones de Thrash e provaram isso mesmo em palco. Um registo desafiante perante um público encharcado que nunca arredou pé.
“Rise Up” foi rapidamente seguido de dois clássicos: ” The Preacher” e “More Than Meets the Eye”.
Do seu álbum mais recente não poderiam faltar as já habituais “Native Blood” e “Dark Roots of Earth”.
Uma banda que está longe dos níveis de acção em palco que possa ter tido mas que prime pelo debitar de temas obrigatórios a reter da sua discografia como “Into the Pit”, “The New Order” e “Pratice What You Preach”. Uma sequência que não passa ao lado de ninguém.
Não eram poucos os que assumiam que os verdadeiros headliners deste terceiro dia seriam os franceses Gojira e os norte-americanos Testament…
Com direito a encore, “DNR (Do Not Resuscitate)” e “3 Days of Darkness” deram o ponto final a uma bonita entrega da banda face a uma paisagem nada facilitada.
Os ingleses Carcass marcaram a despedida dos mais metaleiros no Chaos Stage com o seu mais recente trabalho ‘Surgical Steel’ mas não só… Comprovaram o porquê de serem dos regressos mais necessários do mundo do metal. Pode não ter sido comparável ao auge de outros tempos, mas o conjunto de Liverpool não deixa de ter aquela aura vencedora cheia de classe bem britânica, mesmo fazendo aquilo que fazem melhor, uma banda sonora para o apocalipse.
Não faltaram os clássicos. Uma hora de concerto que, mesmo com chuva, passou num ápice.
Outro fenómeno, difícil de compreender do ponto de vista português, é o sucesso dos Turbonegro! A escala não é nada comparável ao que se passa por cá.
Com uma bela legião de fãs que cedo guardaram lugar frente ao palco, os noruegueses não comprometeram um milímetro com o seu show teatral com rasgos que iam do punk ao rock ao rock mais pesado não ficando nada aquém de tudo o resto.
Outro headliner que por cá seria duvidoso mas que aparentemente ganharam o seu espaço no público Espanhol que os recebeu de braços abertos.
Passadas as tais 11 horas, e com a memória do concerto sem sal de Joey, já distante, os Lagwagon, com o seu punk rock muito skater, serviram de banda sonora para as despedidas, as ultimas selfies e os últimos brindes.
Para o ano cumpre-se uma década de existência do que, sem papas na língua, é o maior festival a juntar hardcore, punk e metal em toda a Península Ibérica. Os cartazes falam por si e a experiência não desilude de todo.
Para a Songs for the Deaf Radio foi um autêntico privilégio assistir de perto a este evento para vos deixar a par de tudo. Há falta disto no nosso país.
A ver também:
-Fotos do dia:
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